O Museu de Belas Artes de Montreal recebe a magnífica exposição dos guerreiros da dinastia Qin. Os meninos em terracota (tem meninas também) são o recheio dessa exposição que também guarda preciosidades como utensílios, moedas e outras formas de representações daquela era.
Não tenho nem de longe gabarito para explicar as coisas que vi. Mas como “Gostar ultrapassa o inteligível”*, eu vou dizer o que mais senti. As estátuas em barro remetem àquele aforismo latino de que ‘ao pó voltarás’, (quia pulvis es, et in pulverem reverteris). Estão divinamente iluminadas de maneira tão quente que as tornam semi-vívidas. É como se a Medusa tivesse acabado de transformá-los em Pedra. Não só os seres humanos como também cavalos, porcos, cachorros...toda sorte de ser vivente reproduzidos em tamanho natural meio desconcertante. Com seus tecidos molengos, suas armaduras forjadas nos corpos, suas bocas semi-abertas, seus modos de transe.
Cheguei a olhar profundamente nos olhos daqueles guerreiros. Eram, naquele momento mágico, a ligação real entre a existência do tal ‘Faraó Oriental’ e seu medo do mistério da morte (aliás, que nos irmana até hoje). São reproduções em série e apesar disso, únicas em si. Obras lúdicas e tácteis, imponentes e verdadeiras. Como a acrobata delicada em seus dedos caprichosos e o jardim aquático com suas garças esverdeadas.
O Imperador tentou ‘resolver’ a questão da morte à sua maneira. Toda aquela pletora de imagens iria consigo para o além, o eterno, o distante. Seu séquito o seguiria para mostrar aos 'do lado de lá 'com quem estariam lidando. Certamente estavam prontos para a delirante descoberta.
* Clarice Lispector
(Dedicado a Miguel, que viu a exposição em Estocolmo)
Nenhum comentário:
Postar um comentário